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Mutações Silenciosas



Até agora as mutações silenciosas eram aquelas a que não correspondia qualquer alteração fenotípica, pois não haveria alteração das proteínas formadas.
As mutações pontuais, trocas de uma única letra, podem levar a alterações de aminoácidos e das proteínas constituídas por eles. O aminoácido pode ser errado e a proteína deixa de ter função ou tem a sua função debilitada. Ou pior, em determinadas trocas de letras pode surgir o sinal de STOP de tradução e a proteína não fica concluída. Outro tipo de mutação é a mutação silenciosa, a troca é feita mas o seu significado é semelhante no codão final (conjuntos de 3 letras que leva à formação de um aminoácido).
Três mutações pontuais modificam moléculas de hemoglobina e são responsáveis por três doenças graves:
Anemia falciforme – Substituição de um aminoácido hidrofílico por um hidrofóbico
Policitemia – Mutação sem sentido (tradução incompleta da proteína) interrompe uma das proteínas da hemoglobina. Esta mutação resulta no espessamento do sangue.
Talassemia – Mutação com sentido (tradução alongada da protína pela retirada do sinal STOP) troca o codão TAA (sinal STOP) pelo CAA. A proteína torna-se disfuncional.

Estratégia
A bactéria Escherichia coli traduz o aminoácido asparagina. O codão AAC aparece com mais frequência no seu DNA do que o codão AAT. Ambos os codões codificam para a asparagina. Contudo observa-se um aumento das taxas de síntese proteica com o AAC. A razão é que os tRNA (estruturas que se inserem no ribossoma e constroem os aminoácidos aquando da entrada do RNA) destes codões aparecem em concentrações diferentes. O tRNA do AAT é mais abundante do que o tRNA do AAC, desta forma há maior probabilidade de se traduzir o aminoácido do AAT. “Análises de genes de mamíferos [plantas, moscas e vermes também apresentam desvios similares] revelam tendências que favorecem determinados codões.”

Sair do Silêncio
Após a transcrição de DNA para RNA são retiradas regiões não codificadas, os intrões. Os exões são deixados, são as regiões codificadas. O RNA contendo apenas os exões é o mRNA. As coisas complicam-se quando se descobre que os exões não têm a função única de codificar para aminoácidos mas também ajudam na remoção dos intrões. Num RNA inicial os intrões e os exões estão alternados. Para que um intrão seja removido terá de haver um sinal que faça a maquinaria remover o intrão. Na junções intrão/exão existem 3 a 8 letras (estimuladores de intrões exónicos – ESSE) que podem ter um sinal de quebra da ligação ou de não quebra, mantendo-os unidos. Estes estimuladores podem fazer com que o organismo opte por certos nucleótidos. Os codões GGA e GGG codificam o aminoácido glicina, mas também se encontram em estimuladores de junções.
Alterações silenciosas nesses estimuladores de junções podem não alterar um aminoácido mas podem interromper a remoção dos intrões, o que poderá ter um efeito nefasto para uma proteína. A fibrose cística é uma doença causada por uma mutação silenciosa que intervém, também, na remoção dos intrões.
Outro mecanismo pelo qual a mutação silenciosa pode ser prejudicial é na dobra do mRNA. Mesmo que o intrão seja removido correctamente, o mRNA pode não dobrar devidamente, apenas pelo facto de uma letra ser diferente. O modo como se dobra determina a estabilidade do mRNA e isso afecta a velocidade de tradução. Alguns distúrbios cognitivos têm este mecanismo associado.

Eficiência
Grzegorz Kudla e colegas alteraram a percentagem relativa de G e C, o que levou a uma produção proteica cem vezes superior comparativamente com os mesmo genes pobres em G e C.
O gene COMT associado à tolerância à dor apresenta uma mutação que resulta numa alteração de um aminoácido. Contudo não há uma única variante deste gene. Não é do tipo on  e off. Pessoas com intolerência à dor alta ou baixa apresentavam os mesmos nucleótidos, o que indicava haver outra causa para as variações. Os últimos resultados apontam para as mutações silenciosas.
J.V. Chamary e Laurence D. Hurst estimam que “entre 5% e 10% dos genes humanos contêm pelo menos uma região onde as mutações silenciosas poderiam ser prejudiciais.”


Fonte: Scientific American “O Custo das mutações Silenciosas”, J.V. Chamary e Laurence D. Hurst , Julho 2009

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03/03/2010

Mutações Silenciosas



Até agora as mutações silenciosas eram aquelas a que não correspondia qualquer alteração fenotípica, pois não haveria alteração das proteínas formadas.
As mutações pontuais, trocas de uma única letra, podem levar a alterações de aminoácidos e das proteínas constituídas por eles. O aminoácido pode ser errado e a proteína deixa de ter função ou tem a sua função debilitada. Ou pior, em determinadas trocas de letras pode surgir o sinal de STOP de tradução e a proteína não fica concluída. Outro tipo de mutação é a mutação silenciosa, a troca é feita mas o seu significado é semelhante no codão final (conjuntos de 3 letras que leva à formação de um aminoácido).
Três mutações pontuais modificam moléculas de hemoglobina e são responsáveis por três doenças graves:
Anemia falciforme – Substituição de um aminoácido hidrofílico por um hidrofóbico
Policitemia – Mutação sem sentido (tradução incompleta da proteína) interrompe uma das proteínas da hemoglobina. Esta mutação resulta no espessamento do sangue.
Talassemia – Mutação com sentido (tradução alongada da protína pela retirada do sinal STOP) troca o codão TAA (sinal STOP) pelo CAA. A proteína torna-se disfuncional.

Estratégia
A bactéria Escherichia coli traduz o aminoácido asparagina. O codão AAC aparece com mais frequência no seu DNA do que o codão AAT. Ambos os codões codificam para a asparagina. Contudo observa-se um aumento das taxas de síntese proteica com o AAC. A razão é que os tRNA (estruturas que se inserem no ribossoma e constroem os aminoácidos aquando da entrada do RNA) destes codões aparecem em concentrações diferentes. O tRNA do AAT é mais abundante do que o tRNA do AAC, desta forma há maior probabilidade de se traduzir o aminoácido do AAT. “Análises de genes de mamíferos [plantas, moscas e vermes também apresentam desvios similares] revelam tendências que favorecem determinados codões.”

Sair do Silêncio
Após a transcrição de DNA para RNA são retiradas regiões não codificadas, os intrões. Os exões são deixados, são as regiões codificadas. O RNA contendo apenas os exões é o mRNA. As coisas complicam-se quando se descobre que os exões não têm a função única de codificar para aminoácidos mas também ajudam na remoção dos intrões. Num RNA inicial os intrões e os exões estão alternados. Para que um intrão seja removido terá de haver um sinal que faça a maquinaria remover o intrão. Na junções intrão/exão existem 3 a 8 letras (estimuladores de intrões exónicos – ESSE) que podem ter um sinal de quebra da ligação ou de não quebra, mantendo-os unidos. Estes estimuladores podem fazer com que o organismo opte por certos nucleótidos. Os codões GGA e GGG codificam o aminoácido glicina, mas também se encontram em estimuladores de junções.
Alterações silenciosas nesses estimuladores de junções podem não alterar um aminoácido mas podem interromper a remoção dos intrões, o que poderá ter um efeito nefasto para uma proteína. A fibrose cística é uma doença causada por uma mutação silenciosa que intervém, também, na remoção dos intrões.
Outro mecanismo pelo qual a mutação silenciosa pode ser prejudicial é na dobra do mRNA. Mesmo que o intrão seja removido correctamente, o mRNA pode não dobrar devidamente, apenas pelo facto de uma letra ser diferente. O modo como se dobra determina a estabilidade do mRNA e isso afecta a velocidade de tradução. Alguns distúrbios cognitivos têm este mecanismo associado.

Eficiência
Grzegorz Kudla e colegas alteraram a percentagem relativa de G e C, o que levou a uma produção proteica cem vezes superior comparativamente com os mesmo genes pobres em G e C.
O gene COMT associado à tolerância à dor apresenta uma mutação que resulta numa alteração de um aminoácido. Contudo não há uma única variante deste gene. Não é do tipo on  e off. Pessoas com intolerência à dor alta ou baixa apresentavam os mesmos nucleótidos, o que indicava haver outra causa para as variações. Os últimos resultados apontam para as mutações silenciosas.
J.V. Chamary e Laurence D. Hurst estimam que “entre 5% e 10% dos genes humanos contêm pelo menos uma região onde as mutações silenciosas poderiam ser prejudiciais.”


Fonte: Scientific American “O Custo das mutações Silenciosas”, J.V. Chamary e Laurence D. Hurst , Julho 2009

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